Você, em algum momento, já parou para pensar como é a vida das pessoas com deficiência visual?
Já imaginou como fazem para cuidar da própria higiene? Será que conseguem realizar atividades domésticas: fazer comida, lavar e passar roupas, cuidar da casa e dos filhos? No caso daquelas que são totalmente cegas, como fazem para distinguirem as cores de roupas e demais utensílios? Tudo isso, sem falar de como fazem também para se locomoverem pelas ruas e utilizarem o transporte público. Enfim, será que elas conseguem estudar e trabalhar como as demais pessoas?
Antes de mais nada, é importante falar que os deficientes visuais precisam passar por um processo de habilitação/reabilitação. Este trabalho é realizado por entidades especializadas no atendimento a esse público específico. Psicólogos, terapeutas ocupacionais e professores de orientação em mobilidade são exemplos de profissionais que constituem a equipe multidisciplinar responsável por promover a autonomia e independência das pessoas com deficiência visual. Não posso deixar de mencionar que o apoio e atenção da família são determinantes, principalmente nessa fase de adaptação e superação das dificuldades.
Mas, afinal, como que os deficientes visuais conseguem realizar, na prática, suas atividades com independência?
No caso das atividades domésticas, é importante que todas as coisas fiquem organizadas em locais acessíveis para facilitar sua localização. Geralmente, os alimentos ficam guardados em recipientes com algum tipo de identificação, seja com etiqueta em braille, ou, simplesmente, pelo tamanho, formato e textura. O olfato também é um importantíssimo instrumento nessas horas! Aliás, quando se está cozinhando algum tipo de alimento, o uso de todos os sentidos é imprescindível: o tato, para sentir a disposição das panelas e textura dos alimentos; o olfato, para avaliar o odor e cheiro; a audição, para ouvir a efervescência e agitação; o paladar, para conferir o sabor e gosto dos alimentos. A partir disso, perceba que, para as demais atividades, os sentidos também “auxiliam” os deficientes visuais. Quando vão lavar e passar roupas, usam o tato e o olfato, para se certificarem da presença de sujeira e “amassadura” no tecido. Na higiene pessoal, também não há necessidade de ajuda de outras pessoas. Penteiam-se e se vestem sem precisarem estar diante de espelho. Tudo isso fazem até de olhos fechados! Risos
E por falar em se vestir, a informação das cores de roupas é importante também para quem tem a deficiência visual, inclusive, para os cegos. A separação e organização das peças de roupas depende muito da opção de cada pessoa, mas, em geral, são organizadas conforme tipo de tecido e cores informados previamente por alguém que enxerga.
A locomoção pelas ruas e pelos espaços públicos se dá com auxílio de bengala, com base nas instruções aprendidas na fase de habilitação/reabilitação. Obviamente, as barreiras de acessibilidade presentes nos espaços arquitetônicos e urbanísticos, sempre atrapalham a vida dos cegos! É por isso, que a solidariedade e a sensibilidade de todas as pessoas fazem a diferença gigantesca!
Eu não falei antes, mas gostaria de informar aos caros leitores deste artigo que sou deficiente visual de nascença. Sou casado com uma pessoa cega e temos uma linda filha que também é deficiente visual. Atualmente trabalho em uma das maiores instituições para cegos do país.
Sou normal como as demais pessoas: faço compras pela internet (com auxílio de leitores de tela no computador e no celular); frequento a estádios de futebol; realizo compras no mercado; assisto a cinemas e peças teatrais (com auxílio da audiodescrição); ando para cima e para baixo com minha bengala.
Portanto, acredito que a felicidade não consiste em ter visão ou não. Ela, sem dúvida alguma, consiste na capacidade de enxergar com os olhos do coração e da alma!!!
Pense nisso!
Possui catarata congênita e, em 2001, aos 12 anos de idade, ficou cego devido a retinose pigmentar.
Em 2005 foi reabilitado pela Fundação Dorina Nowill para Cegos. No ano de 2008 foi contratado pela instituição para trabalhar como controlador de qualidade e paginação dos livros em braille. Trabalhou durante 7 anos como Revisor de textos em braille e atualmente é especialista em acessibilidade na web.
É estudante do curso superior de Análise e Desenvolvimento de Sistema, apaixonado pela Língua Portuguesa e por temas como acessibilidade, inclusão social, políticas públicas e direitos das pessoas com deficiência.